Arquivo da categoria: Política

Giro em falso ~ Slavoj Zizek

praça tahirRevolução emperrada no Egito mostra que a democracia liberal será corroída pelos fundamentalismos enquanto não atender à demanda por justiça social, diz filósofo esloveno.

Com o golpe militar no Egito – em junho de 2013, o Exército, apoiado pelo núcleo duro dos manifestantes que derrubaram o regime de Mubarak dois anos atrás, depôs o presidente democraticamente eleito e o governo –, é como se o círculo de algum modo houvesse se fechado: os manifestantes que derrubaram Mubarak, pedindo democracia, agora celebram um coup d’état militar que abole a democracia. O que está havendo?

[Estadão, 24 ago 13] A leitura prevalecente, sintonizada com a ideologia dominante, foi proposta, entre outros, por (Francis) Fukuyama: o movimento de protesto que derrubou Mubarak foi, mais do que tudo, a revolta da classe média educada, enquanto os trabalhadores pobres e agricultores ficaram reduzidos ao papel de observadores (simpáticos), mas depois que os portões da democracia foram abertos, a Irmandade Muçulmana, cuja base social é a maioria pobre, venceu eleições democráticas e formou um governo dominado por fundamentalistas muçulmanos, de modo que, compreensivelmente, o núcleo original de manifestantes seculares se voltou contra eles e se mostrou disposto a endossar até um golpe militar para derrubá-los. Continue lendo

O caso Marco Feliciano: um paradigma na relação mídia-religião-política ~ Magali N Cunha

Nestes meses de março e abril de 2013 temos lido, ouvido e assistido a um episódio sem precedentes no Congresso Nacional, que coloca em evidência a relação religião-política-mídia. Em 5 de março foi anunciada pelo Partido Socialista Cristão (PSC), a indicação do membro de sua bancada o pastor evangélico deputado federal Marco Feliciano (SP) como presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara Federal (CDH). Foram imediatas as reações de grupos pela causa dos Direitos Humanos ao nome de Marco Feliciano, com a alegação de que o deputado era conhecido em espaços midiáticos por declarações discriminatórias em relação a pessoas negras e a homossexuais. O PSC se defendeu dizendo que seguiu um protocolo que lhe deu o direito de indicar a presidência dessa comissão, um processo que estava dentro dos trâmites da democracia tal como estabelecida no Parlamento brasileiro. Isto, certamente, é fonte de reflexões, em especial quanto ao porquê da defesa dos Direitos Humanos ser colocada pelos grandes partidos como “moeda de troca barata”, como bem expôs Renato Janine Ribeiro em artigo publicado no Observatório da Imprensa (n. 740, 2/4/2013). Soma-se a isto o fato de o deputado indicado e o seu partido não apresentarem qualquer histórico de envolvimento com a causa dos Direitos Humanos que os qualificassem para o posto. Continue lendo

Política carcerária: reintegrar a pessoa ou entregá-la para o crime organizado?

Gláucio Dettmar/Agência CNJ

Para muita gente, deixar pessoas sofrerem no sistema prisional é lindo, uma forma de vingança institucional por conta do sofrimento que causaram em alguém. Vingança, não Justiça. Isso pode ser útil para enganar a si mesmo, achando que transferir a dor aplaca a sua própria. Mas não irá resolver o problema causado e dificilmente conseguirá fazer com que o crime não seja cometido novamente. Não se reintegra, apenas exclui-se ainda mais quem, na maioria das vezes, foi sistematicamente excluído da sociedade. Que compromisso tem a pessoa quando retorna ao convívio social?

[Leonardo Sakamoto, UOL, 14 mar 13] O Manifesto Pela Humanização do Cárcere, primeira iniciativa do Projeto Cárcere Cidadão, foi lançado nesta semana em São Paulo ajudar a debater a questão. O objetivo do projeto é colocar a universidade como protagonista na luta por um sistema de execução penal mais justo e mais humano. Continue lendo

A urgência do desarmamento nuclear à flor da pele

A bomba atômica, lançada pelos Estados Unidos em 1945 sobre Hiroxima, matou 145 mil pessoas e deixou várias centenas de milhares com lesões e doenças graves nas seis décadas seguintes. Foto: Ican

A Campanha Internacional para Abolir as Armas Nucleares adotou uma nova estratégia para atrair a participação ativa de cidadãos e dirigentes políticos na busca de uma proibição mundial das ogivas letais. O perfil da estratégia foi destacado em uma reunião dos responsáveis pela campanha, conhecida como Ican, na cidade turca de Istambul, onde se indicou que a proposta é contribuir para sensibilizar a opinião pública e as autoridades sobre as consequências das detonações atômicas.

[Jacques Couvas, Envolverde/IPS, 4 jan 13] A Ican, uma coalizão de 286 organizações não governamentais de 68 países que trabalham pelo fim do arsenal nuclear no planeta, se comprometeu a ir além da retórica e convida os governos sensíveis ao tema a adotarem medidas concretas. Para isto, prepara um fórum internacional da sociedade civil para os dias 2 e 3 de março em Oslo, que será seguido por uma conferência de especialistas sobre a ameaça nuclear militar, organizada pelo governo da Noruega com apoio de outras 16 nações. Continue lendo

Jonas, o primeiro teólogo da libertação palestino ~ Naim Ateek

Como eu comecei a ler a Bíblia quando garoto, bem antes de ir para o seminário estudar teologia, já estava firmado no conhecimento bíblico. Meu pai me treinara para ler uma vez ao ano todo o Antigo Testamento e duas vezes o Novo Testamento, como ele costumava fazer. Ele dizia que isso era central para minha fé.

O livro de Gênesis e partes do Êxodo eram divertidas. Levítico e Deuteronômio eram maçantes, mas parte do livro de Números continha histórias que eu gostava. As histórias dos livros de Josué e Juízes eram interessantes, mas quando chegava aos profetas tinha que ler página após página de informação que não desfrutava e não podia entender. Em meio ao que parecia para mim terra árida, chegava ao oásis de Jonas, que considerava refrescante.

O livro de Jonas compreende quatro capítulos curtos. É uma bonita história; simples o bastante para as crianças. Na superfície, não parece tão profundo quanto Isaías ou Jeremias, mas eu sentia que era uma história que podia compreender, uma narrativa leve colocada no meio de uma série de livros proféticos que eram prolixos e tediosos. Minha imaginação juvenil corria solta quando pensava em Jonas no meio de uma tempestade no mar e na barriga de uma baleia. Continue lendo

O que faz as prisões do Brasil serem chamadas de ‘medievais’?

O ministro da Justiça José Eduardo Cardozo chamou na semana passada o sistema carcerário brasileiro de “medieval” e disse que preferia morrer a cumprir pena nele por um longo tempo. Especialistas afirmaram que ele está certo, mas disseram que o governo federal poderia fazer mais para resolver o problema.

[Luis Kawaguti, BBC Brasil, 18 nov 2012] Atualmente o Brasil tem a 4ª maior população carcerária do mundo, segundo a organização não-governamental Centro Internacional para Estudos Prisionais (ICPS, na sigla em inglês). O país só fica atrás em número de detentos para os Estados Unidos (2,2 milhões), a China (1,6 milhão) e a Rússia (740 mil). Continue lendo

Comissão Nacional da Verdade investigará atuação das igrejas

A Comissão Nacional da Verdade (CNV) instalará um grupo de trabalho só para investigar a atuação das igrejas católica e evangélica no período da ditadura. Serão apurados não apenas o papel de religiosos na resistência à repressão e proteção a vítimas como também o daqueles que colaboraram com os militares.

O grupo se reúne pela primeira vez nessa quinta. E um dos primeiros a prestar depoimento deve ser Anivaldo Padilha. Evangélico, ele foi delatado por pastores da igreja que frequentava. Foi preso, torturado e partiu para o exílio. Sua mulher estava grávida de Alexandre Padilha, hoje ministro da Saúde -que só conheceu o pai quando tinha oito anos.

As apurações do capítulo religioso serão coordenadas por Paulo Sérgio Pinheiro, um dos integrantes da CNV. Pesquisadores autônomos e teólogos foram convidados a participar dos trabalhos.

Da coluna de Mônica Bergamo, jornalista, publicada na Folha de S. Paulo, 6 nov 12

Tribunal derruba ordem para retirada de índios de fazenda em Iguatemi

Nova decisão foi anunciada pelo ministro da Justiça, em Brasília. Liminar que determinava desapropriação levou tribo a ‘pedir’ morte coletiva.

[Nathalia Passarinho, G1, 30 out 2012] O Tribunal Regional Federal da 3ª Região (SP e MS) cassou nesta terça-feira (30) liminar (decisão provisória) de um juiz federal de Naviraí (MS) que determinava a desocupação pelos índios guarani-kaiowá de área na Fazenda Cambará, em Iguatemi, a 466 km de Campo Grande.

A informação foi anunciada pelo ministro da Justiça, Eduardo Cardozo, em reunião com membros da etnia na Secretaria de Direitos Humanos da Presidência. Cardozo informou ainda que determinou o envio de reforço da Polícia Federal e da Força Nacional para evitar que a tensão entre indígenas e produtores rurais provoque violência. Continue lendo

Com a morte na alma e os lábios em carmim ~ Teixeira Coelho

Sob a ditadura não havia só dois lados: a direita militar (e seus cúmplices civis)  e a esquerda (desarmada ou armada) que resistia. Houve uma terceira margem que rejeitava a primeira  sem aceitar as visões do campo oposto.

[Teixeira Coelho, Estadão, 1 jun 12] Uma história da arte sob a ditadura tem de ser uma história natural da arte sob a ditadura: em sua História Natural,  Plínio o Velho disse que a história  tinha  de ser a história de tudo que cabe “no compasso de nosso conhecimento”.  Ficar só com parte dela é não enxergar muito dela. A ditadura, como outras formas sociais, é marcada pela  permeabilidade. Ela tudo atravessa, tudo afeta — e tudo a atravessa e afeta. Deixa marcas no que nem toca diretamente. E  no que parece não a tocar de frente também se sente o bafo de sua pútrida presença. Continue lendo

Mapa com os pontos de tensão para os povos indígenas na América Latina

Há, atualmente, centenas de conflitos em curso na América Latina que opõem povos indígenas a empresas, políticos e governos locais.

[BBC Brasil, 23 abr 12]Para especialistas, esses confrontos têm ganhado força à medida que pouca ou quase nenhuma garantia é oferecida a essas comunidades de que seus direitos e territórios serão preservados face à expansão urbana. Muitos deles envolvem a construção de obras de infraestrutura e a exploração de recursos naturais.

Confira alguns desses conflitos ainda em andamento na região: Continue lendo