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Jonas, o primeiro teólogo da libertação palestino ~ Naim Ateek

Como eu comecei a ler a Bíblia quando garoto, bem antes de ir para o seminário estudar teologia, já estava firmado no conhecimento bíblico. Meu pai me treinara para ler uma vez ao ano todo o Antigo Testamento e duas vezes o Novo Testamento, como ele costumava fazer. Ele dizia que isso era central para minha fé.

O livro de Gênesis e partes do Êxodo eram divertidas. Levítico e Deuteronômio eram maçantes, mas parte do livro de Números continha histórias que eu gostava. As histórias dos livros de Josué e Juízes eram interessantes, mas quando chegava aos profetas tinha que ler página após página de informação que não desfrutava e não podia entender. Em meio ao que parecia para mim terra árida, chegava ao oásis de Jonas, que considerava refrescante.

O livro de Jonas compreende quatro capítulos curtos. É uma bonita história; simples o bastante para as crianças. Na superfície, não parece tão profundo quanto Isaías ou Jeremias, mas eu sentia que era uma história que podia compreender, uma narrativa leve colocada no meio de uma série de livros proféticos que eram prolixos e tediosos. Minha imaginação juvenil corria solta quando pensava em Jonas no meio de uma tempestade no mar e na barriga de uma baleia. Continue lendo

Profeta: Filósofo, Político, Poeta ~ por Davi Bogomoletz

O profeta é conhecido, em primeiro lugar, como aquele que vê o futuro. A palavra que o designa em hebraico, navi, pode ser compreendida como designando “aquele que traz”, ou seja, aquele que traz de longe alguma coisa que não está no aqui e agora. Enquanto místico, ou seja, aquele que se relaciona com “a outra realidade”, o profeta tinha de fato a visão do futuro, pois Aryêh Kaplan já mostrou como a inspiração profética se produzia graças a sofisticados exercícios de meditação, que levavam os que a praticavam a sair do nível comum de percepção para alcançar o que eu aqui chamaria, para efeitos meramente descritivos, de “ultra-percepção”. (Nos livros “Meditação Judaica” e “Meditação e a Bíblia”, Kaplan explica de que modo os profetas utilizavam a meditação.) E pelo menos em um lugar, o profeta é designado na Bíblia como “vidente”. Mas, por tudo o que podemos ver, se lermos os seus textos, não era essa a sua função mais importante. E eu havia prometido a vocês falar hoje do profeta como político, filósofo, poeta, conjunto de atividades, ou atribuições, muito mais importantes na história da profecia bíblica. Eu deveria, então, falar um pouco de cada uma dessas dimensões. Mas não é o que vou fazer.

Eu me dei conta de que para conhecer o profeta enquanto poeta basta abrir a Bíblia. E vou dar um exemplo. Abri o livro do profeta Sofonias – Tzefanyâh – um profeta considerado “menor”, porque o seu texto é muito curto. É um dos “doze”, os profetas de textos muito pequenos, contidos todos num único livro. Ele é considerado um profeta admoestador, de duros discursos contra os opressores e os exploradores. Nele encontramos a idéia de que os homens de bem de Israel serão salvos, enquanto os maus perecerão, e o mesmo ocorrerá às outras nações: as que se salvarem reconhecerão a Lei de Ad’. No capítulo 3 temos alguns versículos que funcionarão como exemplo tanto de linguagem poética quando de discurso político. Infelizmente, o ritmo muito marcado dos versos em hebraico não pode ser fielmente transmitido na tradução, o que diminui em muito o seu impacto. Aqui tentei uma tradução um tanto livre, justamente na intenção de preservar o ritmo do texto original. Continue lendo