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Demonização de Israel alimenta antissemitismo, diz especialista

O atentado em Toulouse, na França, em que três crianças judias e um rabino foram executados por um muçulmano francês, mostrou que o antissemitismo está vivo na Europa, alimentado por islamitas radicais sob a cumplicidade de partes da mídia e dos políticos.

[Marcelo Ninio, FSP, 26 mar 12] Jerusal̩m РEsta ̩ a avalia̤̣o do professor Robert Wistrich, chefe do Centro Internacional de Estudos do Antissemitismo, da Universidade de Jerusal̩m, e um dos maiores estudiosos do mundo no tema.

Em entrevista à Folha, ele disse que desde o Holocausto o antissemitismo sofreu uma metamorfose na Europa, e hoje a principal força por trás é o islã fundamentalista, ao qual pertencia o terrorista de Toulouse. Continue lendo

Morte de detentos põe em xeque ‘kit antissuicídio’ em prisões da França

[Daniela Fernandes, BBC Brasil, 22 set 11] Um detento de 23 anos se enforcou em sua cela na prisão da Santé, em Paris, utilizando o pijama de papel do chamado “kit antissuícidio”, distribuído aos presos considerados psicologicamente frágeis e que correm risco de pôr fim às suas vidas.

O caso, ocorrido na madrugada da última segunda-feira, ganhou repercussão na França porque é a segunda vez, no período de apenas cinco meses, que um preso se mata utilizando justamente material do kit antissuicídio.

Este inclui, além do pijama de papel, descartável após usado apenas uma vez, um colchão à prova de fogo e lençóis e cobertores com tecidos especiais que não podem ser rasgados.

Como no caso ocorrido nesta semana, um outro detento, também de 23 anos, havia se enforcado em abril passado em um presídio no Havre, no oeste da França, amarrando o pijama de papel nas grades de sua cela. Continue lendo

França inicia deportação controversa de cidadãos da etnia rom

Após evacuação compulsória de assentamentos de cidadãos da etnia rom na França, Sarkozy concretiza ameaça e inicia deportação dos mesmos para Romênia e Bulgária. Até fins de agosto, 700 roms serão expulsos do país.

A França deu início ao processo de deportação dos membros da etnia rom: nesta quinta-feira (19/08), um grupo de 93 pessoas deixou o país rumo a Bucareste, a capital romena: 14 deles voaram de Paris e outros 79 de Lyon. Na próxima sexta-feira (20/08), outros 132 roms devem seguir para a cidade romena de Timisoara.

Oficialmente, trata-se, segundo as autoridades francesas, de “deportações voluntárias”, supostamente impulsionadas por um “parco incentivo financeiro” por parte do governo francês: cada adulto recebe 300 euros e cada criança 100 euros pela viagem de volta à Romênia.

Como os cidadãos da etnia rom, originários da Romênia e da Bulgária, são cidadãos da União Europeia, eles podem regressar à França – ou a qualquer outro país do bloco – a qualquer momento. A partir de setembro próximo, as autoridades francesas pretendem instituir o registro de impressões digitais de cada cidadão que receber o auxílio-retorno no país, a fim de evitar “que alguém receba a ajuda várias vezes”.

Até o final do mês de agosto, 700 roms deverão ser expulsos da França. Nas duas últimas semanas, a polícia francesa dissolveu mais de 50 assentamentos ilegais de membros da etnia no país. Em julho último, o presidente Nicolas Sarkozy havia anunciado o início de uma política linha-dura contra os roms, após tumultos ocorridos em acampanhamentos no país.

Reações adversas

As autoridades romenas mostraram-se “preocupadas” com os prodecimentos adotados pela França. O ministro romeno das Relações Exteriores, Teodor Baconschi, denunciou os “descarrilhamentos populistas” e as “reações xenófobas” do governo francês. O presidente romeno, Traian Basescu, salientou que as deportações demonstram a necessidade urgente de um plano europeu de integração para as comunidades rom.

O ministro francês do Interior, Brice Hortefeux, deverá reunir-se na próxima semana com representantes da etnia para discutir a situação. Estima-se que aproximadamente 10 mil roms, provenientes da Romênia e da Bulgária, já tenham retornado a seus países de origem no ano passado. As atuais deportações, no entanto, são as primeiras desde o anúncio de Sarkozy de adoção de uma política mais severa em relação à minoria étnica.

UE observa procedimentos

Matthew Newman, porta-voz da Comissão Européia, informou que a situação vem sendo acompanhada “com muita atenção” pelo órgão. O ministério francês do Exterior, por sua vez, assegura que os procedimentos de deportação dos cidadãos da entnia rom não estão em desacordo com as diretrizes europeias.

“As medidas adotadas pelas autoridades francesas com relação ao desmantelamento de acampamentos ilegais estão completamente de acordo com as normas europeias e não afetam, de forma alguma, o livre trânsito dos cidadãos europeus, definido pelos tratados do bloco”, afirmou o porta-voz do ministério francês de Relações Exteriores, Bernard Valero.

Na França, vivem atualmente cerca de 15 mil roms originários do Leste Europeu. Na Romênia, a comunidade é composta por 530 mil membros, segundo o censo nacional. De acordo com algumas ONGs, no entanto, há 2,5 milhões de roms vivendo no país, sendo que muitos deles omitem a origem temendo serem discriminados.

NP/afp/dpa
Revisão: Soraia Vilela

Fonte: DW, 19 ago 2010

Se a religião é o “ópio do povo” é também “o suspiro dos oprimidos”

Por Tariq Ali, 28 fev 2010

Perdoem um observador externo, ateu convicto ainda por cima, que ao ler os recentes comentários da imprensa francesa sobre Ilhem Moussaid, a candidata do NPA a Avignon com um lenço na cabeça, teve o sentimento de que havia alguma coisa estragada na política cultural francesa. Recomecemos.

À evidência, Ilhem está de acordo com um programa que defende o aborto, a contracepção, etc., quer dizer com o direito duma mulher decidir da sua vida em toda a liberdade. Mas ela não tem o direito de escolher o que põe na cabeça. É mesmo surpreendente.

Nenhum preceito corânico está em causa. O Livro diz: “Que elas coloquem os seus véus sobre si e dissimulem a sua beleza”. Um mensagem corânica que pode ser interpretada de diferentes maneiras. Aliás é contornado por numerosas egípcias que se arranjam com lenços embora moldados em jeans, quando se cruza o Cairo. São tradições patriarcais e culturais que estão em jogo e que variam duma geração para outra. Reenviar as pessoas para o seu gueto não interessa a ninguém. Cresci numa família comunista em Lahore. A minha mãe nunca usou o lenço. Nos anos 1950 tinha fundado um grupo feminista que trabalhava com mulheres das classes populares. Muitas mulheres de diferentes partes do mundo, muçulmanas ou não, contar-vos-ão histórias similares.

As argelinas que lutaram na resistência contra o colonialismo republicano francês fizeram-no em nome do anti-imperialismo. Algumas estavam veladas, outras não. Isso não modificou nem a sua maneira de lutar nem os método utilizados pelos franceses para as torturar. Talvez os seus carrascos se devessem ter mostrado mais brutais com as resistentes veladas a fim de que a sua progenitura se integrasse melhor na República?

Em 1968-1969 os estudantes paquistaneses, operários, empregados e mulheres – entre as quais prostitutas – bateram-se durante três meses conta a ditadura militar, E ganharam. Foi a única vitória no curso desses anos. Os grupos religiosos, que apoiavam os militares, foram isolados e desfeitos. E numerosas estudantes que se batiam conosco traziam o lenço e escandiam slogans contra o Jamaat-il-Islami. Faltamos aos nossos deveres ao aceitar que elas participassem nas manifestações sem retirar o lenço? Por razões estéticas teria preferido que andassem de cabeça nua, mas no que respeita ao nosso combate isso não mudava nada.

A cólera que levantou Ilhem Moussaid está deslocada. Deveria ter sido dirigida contra os responsáveis do milhão de mortos no Iraque, o cerco ininterrupto de Gaza por Israel e Egito, o assassinato de inocentes no Afeganistão, os ataques de aviões não-pilotados americanos no Paquistão, a exploração brutal do Haiti, etc. Perguntamo-nos qual é a causa desta fúria desviada.

Há alguns anos notei que em França as manifestações contra a guerra no Iraque eram quase inexistentes comparadas com o resto da Europa do Oeste. Recuso-me a explicá-lo pela tomada de posição de Jacques Chirac contra esta guerra. Fundamentalmente trata-se dum problema de islamofobia: uma intolerância crescente para com o Outro na sociedade francesa que não deixa de lembrar a atitude dos franceses em relação aos judeus no decurso do séc. 19 e, sobretudo, no início do 20.

Mais tarde é o conformismo ambiente que explicava a popularidade de Vichy durante os primeiros anos da guerra. Os islamófobos e os antisemitas tiveram muitas coisas em comum. As diferenças culturais ou de “civilização” são postas em evidência para sancionar as comunidades de imigrantes na Europa. Mas os imigrantes e os países para onde imigram não se assemelham. Tomem o caso dos Estados Unidos. Eis um território povoado por imigrantes em grande número, a partir do séc. 17, eram protestantes fundamentalistas e, desde então, depende da imigração.

Na maior parte dos países da Europa de Oeste a primeira grande vaga de imigração provinha das antigas colônias. Na Grã-Bretanha os imigrados vinham das ilhas das Caraíbas e da Ásia do Sul, e em França do Magrebe. Sem renunciar à sua identidade integraram-se de diferentes maneiras e a diferentes níveis. Os asiáticos do Sul, principalmente camponeses mas também operários, não foram muito bem tratados pelos sindicatos.

Apesar disso, os operários imigrados da Ásia do Sul conduziram lutas memoráveis pelo sindicalismo. Os indianos, em particular, vinham duma cultura muito politizada onde o comunismo estava bem representado e trouxeram a sua experiência para a Grã-Bretanha. Os paquistaneses, menos politizados, tendiam a reproduzir os grupos que reflectiam a lealdade aos clãs das suas aldeias ou das aldeias de origem.

Os diferentes governos britânicos encorajaram a religião reclamando mulás, a fim de que os imigrados fossem mantidos à margem das correntes racistas da classe operária durante os anos 1960 e 1970. Em França foi a integração forçada. Ensinava-se a cada um que tinha os mesmos direitos que qualquer outro cidadão, o que era desmentido pelos factos. As necessidades materiais e um desejo de viver melhor é que alimentaram a cólera, não as crenças religiosas.

Durante os tumultos nos subúrbios em 2005, Nicolas Sarkozy, então ministro do interior, tal como os ultras nos romances de Stendhal, falou da “canalha”. Fiz muitas vezes notar que, para grande desgosto de alguns esquerdistas, os garotos que se revoltaram tinham integrado o melhor das tradições francesas: 1789, 1793, 1871, 1968. Quando a opressão se tornou intolerável os jovens barraram as estradas e atiraram-se à propriedade. As privações, não a fé, é que estão na origem da sua cólera.

Quantos cidadãos ocidentais têm uma ideia precisa do que foi realmente o período das Luzes? Os filósofos franceses fizeram sem dúvida progredir a humanidade ao não reconhecer nenhuma autoridade externa, mas havia uma face mais sombria. Voltaire: “Os Brancos são superiores aos Pretos, como os Pretos o são em relação aos macacos”. Hume: “Na Jamaica falam dum Preto que seria um homem erudito; mas é provável que ele seja admirado por fracos talentos, como um papagaio que pronuncia algumas palavras claramente”. E não faltam exemplos do mesmo calibre entre os seus amigos pensadores. É este aspecto das Luzes que me parece o mais afinado com os delírios islamófobos de alguns meios de comunicação do mundo globalizado.

Marx escreveu bem que a religião era “o ópio do povo”, mas a frase que se segue, onde a qualifica como “suspiro dos oprimidos” é o mais das vezes esquecida. Ela explica em parte a subida da religiosidade em cada comunidade depois da queda do comunismo. Os pais dos jovens das escolas normais que se juntam para celebrar a missa estão horrorizados. As minhas amigas do mundo muçulmano queixam-se que as filhas põem o lenço para protestar contra as normas familiares. Foi sempre assim.

Artigo publicado no jornal Le Monde de 20 de Fevereiro de 2010 e republicado em Esquerda.net, com tradução de Paula Sequeiros

Onda de suicídios leva França a discutir cultura ‘pós-privatizações’

Daniela Fernandes, de Paris, para a BBC Brasil

Uma onda de suicídios numa das maiores empresas francesas vem levando o país a discutir o “choque cultural” entre os valores tradicionais do funcionalismo público do país e o foco na competição adotado após processos de privatização.

Após o 25º suicídio de um funcionário da France Télécom em apenas 20 meses, o governo francês fixou nesta semana um prazo para que grandes empresas do país adotem medidas contra o estresse no trabalho.

A própria empresa, privatizada em 2004, anunciou a suspensão de seus processos de restruturação e de realocação obrigatória de funcionários após os 25 suicídios, além de 15 outras tentativas de empregados de tirar suas próprias vidas.

Para analistas, o fenômeno é consequência desse “choque cultural” que opõe a visão tradicional que atribuía ao funcionalismo público um caráter social e as novas políticas comerciais agressivas, que privilegiam o aumento constante das vendas e da rentabilidade.

Abertura

O primeiro “choque” empresarial sofrido pela France Télécom ocorreu em 1998, com a abertura do mercado francês de telecomunicações à concorrência, por determinação de uma diretiva europeia.

A segunda grande transformação foi em setembro de 2004, quando a empresa foi privatizada, 115 anos após ter sido nacionalizada.

Os empregados da operadora histórica de telefonia, que foram funcionários públicos durante mais de um século, se transformaram nos últimos anos em agentes comerciais e passaram a sofrer pressões constantes da direção em relação ao desempenho das vendas.

Para enfrentar a concorrência, a direção da empresa criou um plano de restruturação que vem obrigando os funcionários a mudar de serviço, desempenhar novas funções e serem transferidos para outras áreas geográficas.

Após o 25° suicídio em menos de dois anos, além de 15 tentativas de outros empregados de pôr fim à vida, a direção da France Télécom anunciou a suspensão de todas as reestruturações até o dia 31 de dezembro.

Em setembro, o grupo já havia anunciado o congelamento, também até o final do ano, da transferência obrigatória de trabalhadores para outras regiões.

Funcionários supérfluos

Muitos técnicos, que instalavam e faziam a manutenção das linhas telefônicas, se tornaram supérfluos devido às mudanças tecnológicas e também em razão do fato de o país ter atingido um nível de cobertura da rede que não necessitava mais a instalação de várias novas linhas, diz o economista Thomas Coutreau, que lida com questões de saúde no emprego no ministério francês do Trabalho.

“Eles se tornaram agentes comerciais sem preparo nenhum para a atividade. O trabalho deles não era vender qualquer coisa a qualquer preço. Eles viam antes sua função como um serviço público, algo que tinha valor para a sociedade. A cultura comercial de privilegiar vendas os deixou desestabilizados”, diz o economista.

O mal-estar dos empregados também foi ampliado pela instauração de uma competição individual, em relação a metas de vendas. “Isso minou a solidariedade entre os colegas”, afirma Coutreau.

“Há 30 ou 40 anos, não havia suicídios no trabalho. O surgimento disso está ligado à desestruturação da solidariedade entre trabalhadores. Ela foi esmagada pela avaliação individual dos desempenhos”, diz o psicanalista Christophe Dejours, co-autor do livro “Suicídio e Trabalho, o que fazer?”.

Os empregados que ocupam cargos de chefia na France Télécom também sofrem pressões da alta direção para demitir funcionários que não têm bom desempenho. O grupo demitiu 22 mil trabalhadores entre 2005 e 2008.

O psicanalista se diz cético em relação à utilidade dos questionários sobre o estresse no trabalho enviados nesta semana pela France Télécom aos seus empregados. A medida foi aprovada pelos sindicatos. “Essa pesquisa não diz o que é preciso fazer realmente”, afirma.

Comoção

Os suicídios na companhia comoveram a sociedade francesa e levaram a direção da France Télécom, que se recusa a demitir seu presidente, Didier Lombard, a substituir o número dois do grupo, Louis-Pierre Wenes.

Para o economista Coutreau, a crise na France Télécom não teria alterado a imagem dos franceses em relação à empresa. “Muitos se identificam com esses problemas porque vivem pressões semelhantes no trabalho”, diz ele.

“Mas alguns pensam que os ex-funcionários públicos não sabiam o que era a vida profissional e não aguentam a competição no mercado de trabalho”, afirma.

Entre os países ricos, a França possui uma das mais altas taxas anuais de suicídios, de 19,6 por 100 mil habitantes.