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Marx estava certo… sobre o capitalismo ~ John Gray

Como efeito colateral da crise financeira, mais e mais pessoas estão começando a pensar que Karl Marx estava certo. O grande filósofo, economista e revolucionário alemão do século 19 acreditava que o capitalismo era radicalmente instável.

[John Gray/ Filósofo político e escritor/ BBC Brasil, 18 set 2011] Ele tem uma tendência intrínseca de produzir avanços e fracassos cada vez maiores, e no longo prazo, ele estava destinado a se autodestruir.

Marx saudava a autodestruição do capitalismo. Ele era confiante que uma revolução popular ocorreria e daria origem um sistema comunista que seria mais produtivo e muito mais humano. Continue lendo

A esquerda mundial após 2011 ~ Por Immanuel Wallerstein

Por qualquer ângulo, 2011 foi um bom ano para a esquerda mundial – seja qual for a abrangência da definição de cada um sobre a esquerda mundial. A razão fundamental foi a condição econômica negativa, que atinge a maior parte do mundo. O desemprego, que era alto, cresceu ainda mais. A maioria dos governos enfrentou grandes dívidas e receita reduzida. A resposta deles foi tentar impor medidas de austeridade contra suas populações, ao mesmo tempo em que tentavam proteger os bancos.

O resultado disso foi uma revolta global daquilo que o movimento Occuppy Wall Street chama de “os 99%”. Os alvos eram a excessiva polarização da riqueza, os governos corruptos, e a natureza essencialmente antidemocrática desses governos — tenham eles sistemas multipartidários ou não.

O Occuppy Wall Street, a Primavera Árabe e os Indignados não alcançaram tudo o que esperavam. Mas sim conseguiram alterar o discurso mundial, levando-o para longe dos mantras ideológicos do neoliberalismo — para temas como desigualdade, injustiça e descolonização. Pela primeira vez em muito tempo, pessoas comuns passaram a discutir a natureza do sistema no qual vivem. Já não o vêem como natural ou inevitável… Continue lendo

O violento silêncio de um novo começo ~ Slavoj Zizek

[IHU, 18 nov 11/El País, 17 nov 11; tradução Cepat] O que fazer depois da ocupação de Wall Street, com os protestos que começaram longe (Oriente Médio, Grécia, Espanha, Reino Unido) atingiram o centro e agora, fortalecidos, estão se espalhando pelo mundo? Um dos maiores perigos que enfrentam os manifestantes é enamorarem-se por si mesmos. Em São Francisco, numa concentração de solidariedade a Wall Street, no 16 de outubro de 2011, se ouviu um convite para participar no protesto, como se fosse uma concentração hippie dos anos sessenta: “Perguntaram qual é o nosso programa. Estamos aqui para nos divertir”.

Organizar uma acampamento é legal, mas o que realmente importa é o que sobra no dia seguinte, o que muda em nossa vida cotidiana. Os manifestantes devem enamorar-se do trabalho duro e paciente. Não são um final, mas um começo, e sua mensagem fundamental é: quebrou-se o tabu, não vivemos no melhor mundo possível, e temos o direito e mesmo o dever, de pensar em alternativas. Em uma espécie de tríade hegeliana, a esquerda ocidental voltou aos seus princípios depois de abandonar o chamado “fundamentalismo da luta de classes” pela pluralidade de lutas anti-racistas, feministas, etc, o problema fundamental volta a ser o “capitalismo”. A primeira lição deve ser: não devemos culpar as pessoas, nem atitudes. O problema não é a corrupção ou a ganância, é o sistema que nos empurra a ser corrupto. A solução não é “a rua em frente a Wall Street”, mas sim mudar o sistema no qual a rua não pode funcionar sem Wall Street. Continue lendo

A desglobalização e seus inimigos ~ por Frédéric Lordon

Equilibradas sobre o fio da dívida pública, as economias ocidentais pulam de crise em crise. Cúpulas em que se decide a sorte de um país são rotina para os políticos, que, há três anos, assumem um papel de pronto-socorro das finanças. Mas um outro caminho tem sido aberto, quem tem medo da desglobalização?

[Frédéric Lordon, Le Monde Diplomatique, 16 nov 11] No início, as coisas eram simples: havia a razão, que andava em círculos, e a insanidade. Os racionais estabeleceram que a globalização era a realização da felicidade, e todos aqueles que não tivessem o bom gosto de acreditar nisso deviam ser trancafiados. Por duas décadas, essa “razão” impediu metodicamente qualquer debate, concordando em abrir-se apenas quando sobreveio o espetáculo da maior crise do capitalismo.

Os terríveis efeitos da mega-austeridade europeia se farão sentir realmente na França a partir do primeiro semestre de 2012. No cruzamento entre delírio financeiro, política econômica tutelada pelo mercado e deslocalizações que prosseguem durante a crise, a globalização promete mostrar-se em seus mais ofuscantes trajes: desemprego, precariedade, desigualdade, perda da soberania popular.

A liberalização financeira e o poder acionário, a construção da Europa com base na escolha deliberada de expor a política econômica à disciplina do mercado financeiro, a concorrência livre e leal são todas aquelas coisas intocáveis que devem ser ditas (contra o inferno das que não devem ser ditas) para poder continuar apertando a mão do ministro, ser convidado para falar na televisão, ser consultado pelos partidos (de esquerda e direita) – em uma palavra, ser amado pelas instituições. Continue lendo

Os vícios de um sistema parasitário ~ Zygmunt Bauman

“O capitalismo, dizendo-o de forma crua, é, substancialmente, um sistema parasitário. Como todos os parasitas, ele pode prosperar por um certo período quando encontra um organismo ainda não explorado do qual se nutre. Mas não pode fazer isso sem danificar o hospedeiro, destruindo, portanto, antes ou depois, as condições da sua prosperidade ou até da sua sobrevivência”.

[La Repubblica, IHU Online, 30 set 09] Assim como o recente “tsunami financeiro” demonstrou aos milhões de indivíduos, “além de toda razoável dúvida”, que a miragem da “prosperidade agora e para sempre” havia iludido na convicção de que os mercados e os bancos do capitalismo eram os métodos garantidos para a resolução dos problemas, o capitalismo oferece o melhor de si não ao resolver os problemas, mas ao criá-los.

O capitalismo, justamente como os sistemas de números naturais dos famosos teoremas de Kurt Gödel (mesmo se por razões diversas…), não pode ser simultaneamente coerente e completo. Se é coerente aos seus princípios, surgem problemas que ele não é capaz de enfrentar (quero lembrar que a aventura dos “empréstimos subprime”, mostrada à opinião pública como o caminho para dar um fim ao problema dos sem-teto, aquela praga que o capitalismo, como se sabe, produz sistematicamente, multiplicou, pelo contrário, o número dos sem-teto por meio da epidemia das expropriações…). E, se procurar resolvê-los, não o conseguirá sem cair na incoerência com os próprios pressupostos de fundo. Continue lendo

“Jovens não têm futuro a não ser que quebrem o sistema”, diz Francisco de Oliveira

No capitalismo, o ócio é o usufruto de um tempo conquistado na relação entre trabalhadores e empregadores. Sem trabalho, não existe ócio.

[Folha SP, 17 ago 11] Portanto, nos países capitalistas avançados que convivem com altas taxas de desemprego, os jovens “não têm futuro, a não ser que quebrem o sistema”.

Esse foi o raciocínio exposto na noite de terça-feira no Rio pelo sociólogo Francisco de Oliveira, professor emérito da USP, convidado a fazer uma abordagem marxista do “elogio à preguiça” no ciclo de conferências organizado pelo filósofo Adauto Novaes –e que ocorre também em São Paulo e Belo Horizonte.

“A reprodução do sistema vai levando a formas cada vez mais sofisticadas de uso do trabalho que desmontam as velhas estruturas”, disse Oliveira, 77.

Citou um exemplo europeu: “A Espanha, um sucesso formidável depois que entrou na União Europeia, agora tem 25% da força de trabalho desempregada, a maioria jovens. O tipo de emprego que o capitalismo industrial criou durante 50 anos, dos anos 1930 aos 80, desapareceu. O sistema tem mais capacidade de produzir esses jovens desempregáveis do que antes.” Continue lendo