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Uvas e pães

  • Foto do escritor: José Prado
    José Prado
  • há 1 dia
  • 4 min de leitura
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A espiritualidade cristã me convida a ser uva, não pérola; pão, não pedra.

 

Pérolas e pedras, por mais belas, po

r mais preciosas que sejam, são estéreis. Estéril, na medicina, é a vida incapaz de reproduzir vida. Na natureza, é o lago que, por não receber água nova e não escoar água velha, torna-se morto. Faz mal. Fede.

 

Quem crer em mim, do seu interior fluirão rios de água viva... (Jo 7.38)

 

Uvas e pães, se não esmagados e partidos, também são estéreis.

 

O que é uma uva ou um pão que não é deglutido? Um pouco melhor do que um quadro de ‘natureza morta’, um vaso com flores de plástico numa mesa de jantar... Estéril.

 

Na natureza há uma dinâmica: noite antecede o dia, inverno antecede primavera; Assim é na espiritualidade cristã: morte gera vida, cruz antecede ressurreição, sofrimento antecede glória.

 

Se alguém quiser me seguir, negue-se a si mesmo, tome cada dia sua cruz e siga-me. Se o grão de trigo cair na terra e não morrer, fica ele só. Mas se morrer, dá muito fruto (Jo 12.24). Eu vim para que tenham vida, e vida em abundância (Jo 10.10). O filho do homem não veio para ser servido, mas para servir e dar sua vida em resgate de muitos (Mc 10.45).

 

Mistério. Paradoxo. Para que haja vida, vida precisa ser repartida. E o preço de se repartir vida é a morte da própria vida.

 

Pra reproduzir-se, é preciso enfrentar a morte, a entrega, a dor. Voluntariamente... Uma vez iniciado o processo de moagem, de partição - de discipulado... - havendo resistência, amargamos, emboloramos, petrificamos, esterilizamos...

 

Uvas amargas e pães embolorados fazem mal. Além de não alimentar, entristecem, adoecem.

 

Repito. Há de ser um processo voluntário, submisso, para que a vida partida torne em vida.

 

Cristo entregou sua vida por nós. Ele espontaneamente a deu (Jo 10.18).

 

Foi ferido, sim. Esmagado e moído, sim. Sofreu, sim. Mas em momento algum se rebelou contra a vontade do Pai. Em momento algum deixou-se amargar no processo de quebrantamento. Houve momentos de tensão, de dúvida, de abatimento, de decepção? Sim... E não foram poucos.

 

Nessas horas, encontramos Jesus subindo as montanhas, adentrando a escuridão, antecipando a aurora, buscando na solitude, no deserto, a comunhão com o Pai que lhe daria a força (vida) para mais um passo, mais um dia, mais uma cidade, mais uma entrega...

 

Assim como o Pai me enviou, eu envio vocês...(Jo 20.21)

 

Cristo nos chama a sermos uva que se deixa esmagar, pão que se deixa partir.

 

Vida e graça repartida.

 

Cristo partido em nós, a serviço do mundo, do próximo, do necessitado, do aflito.

 

Existe uma glória, um brilho especial, nas vidas que se deixaram esmagar e partir-se: Moisés, Jeremias, Maria, Cristo, Paulo, Barnabé, João, Francisco de Assis, Wesley, Martin Luther King Jr, Bonhoeffer, Madre Tereza...

 

Pessoas que nos mostraram não o brilho das pérolas, das celebridades; mas que através de uma vida de serviço, de entrega, sujaram mais do que mãos e aventais. Eles sangraram física, mental e emocionalmente... Neste processo, ainda que não percebessem e nem mesmo buscassem, a glória de Cristo, o Emanuel, foi resplandecida.

 

E todos nós, com a face descoberta, contemplamos como um espelho a glória do Senhor. E somos transformados de glória em glória... (2Cor 3.18)

 

Existe diante de nós, igreja brasileira, em nossos dias, duas matrizes espirituais, dois caminhos, duas espiritualidades totalmente distintas. Ambas se dizem bíblicas. Uma, contudo, é cristã.

 

Pérola ou uva; pedra ou pão. Quem você é?

 

Pérola ou uva; pedra ou pão. Qual é o teu Deus?

 

Eis que diante de você, hoje, coloco dois caminhos: Qual deles escolherá? (Dt 30.19)

 

O caminho do deus que te acena com o brilho das pérolas e das pedras preciosas, dos tapetes vermelhos, dos auditórios e gabinetes luxuosos, da pompa, da deferência servil...

 

Ou escolherás o caminho do Deus da manjedoura, da pequena e esquecida Nazaré da Galileia, do carpinteiro de mãos ásperas, do rabi rejeitado que não teve lugar pra reclinar sua cabeça?

 

Escolherás o caminho do Deus que se fez gente e tocou em leprosos? Que andou com discípulos embrutecidos, mulheres exploradas, pessoas anônimas? Escolherás o caminho do Deus que de tão grande lavou os pés dos pequeninos? Sim, o Messias da bacia e da toalha, que se deixou esmagar, que se deixou pregar numa cruz em teu lugar... em meu lugar?

 

Mas ele foi ferido pelas nossas transgressões, e esmagado por causa de nossas iniquidades. O castigo que nos trouxe paz estava sobre ele, e pelas suas feridas fomos curados... (Is 53.5)

 

O amor de Deus em nós, quando nos deixamos partir, quando nos deixamos moer, é transformado em vinho que alegra e pão que alimenta.

 

Isso é serviço cristão. Isso é ministério. Isso é vida cristã. Partida, moída, servida, saborosa.

 

Isso é vida. É alegria. É força.

 

É Cristo.

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