Os dois lados da moeda ~ Natália Garcia

sampa2Há dois estudos mundiais publicados esse ano em que a cidade de São Paulo se destacou. Um é o Benchmarking the Future Competitiveness of Cities, feito pelo grupo que publica a revista The Economist, que aponta que São Paulo é a cidade que mais cresce em competitividade econômica no mundo. Já de acordo com o ‘Megacity Mental Health Survey’, coordenado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), São Paulo é a cidade com maior incidência de transtornos mentais no mundo. Ou seja, a cidade que mais aumentou sua competitividade é também a mais doente do mundo. E, ao que tudo indica, essas duas informações estão relacionadas.

[Natália Garcia, 16 ago 13, Superinteressante] Para medir a competitividade das cidades, a The Economist criou 8 indicadores: Força Econômica, Capital Físico, Maturidade Financeira, Ordem Institucional, Ordem sócio-cultural, Capital Humano, Meio Ambiente e Apelo Global. (Entenda melhor cada critério no relatório completo). Daí, criou uma equação para combinar esses indicadores, gerou um ranking de competitividade entre cidades, e fez uma projeção para o ano de 2025. São Paulo é a cidade que mais deve crescer até lá, subindo da 61º posição, que ocupa hoje, para a 36º. Mas, se analisarmos cada indicador separadamente, podemos concluir que a economia de São Paulo vai bem (estamos em 9º lugar no critério Maturidade Financeira), sem que isso signifique a melhoria da qualidade de vida das pessoas (ficamos com a 77º posição em Capital Humano).

Ao contrário, esse aumento da competitividade pode estar tendo um efeito negativo sobre os paulistanos. A Fapesp, responsável brasileira por fornecer dados ao estudo da OMS, concluiu que 30% dos habitantes da Região Metropolitana de São Paulo apresentam transtornos mentais – a maior incidência do mundo. Os grupos mais afetados são os mais carentes, com menor renda mensal e escolaridade.

A combinação entre esses dois estudos mostra que, diferente do que pregava a teoria, crescimento econômico não é sinônimo de bem-estar para as pessoas. Essa, aliás, é a tese central do livro do economista André Lara Resende Os Limites do Possível. Ele explica que o aumento da renda sempre esteve associado a uma vida melhor para todos. Mas com o tempo, os economistas perceberam que isso só era parcialmente verdade. Por um lado, não há como melhorar a qualidade de vida de comunidades excessivamente pobres sem aumentar sua renda. Mas quando o dinheiro acumulado atinge um nível que atende as necessidades básicas de todos, a correlação entre crescimento e bem-estar se enfraquece. “Desse nível em diante, não é mais o crescimento econômico, mas a redução das desigualdades que contribui para o bem estar, inclusive, dos afortunados, como demonstra o aumento da criminalidade, a necessidade de viver confinado em condomínios fortificados e se locomover em carros blindados, cercados de seguranças”.

Não adianta ser a cidade mais rica do país se 11% dos paulistanos (2 milhões de pessoas) moram em favelas. Não adianta ser a cidade que mais cresce em competitividade no mundo se os rios seguem poluídos, o saneamento básico é insuficiente, o transporte público é ineficaz e o trânsito tem a velocidade média de uma galinha. Se do ponto de vista individual não dá para responder de forma definitiva se dinheiro traz felicidade, no plano social o debate está resolvido: a partir de um certo nível, riqueza não garante mais a qualidade de vida das pessoas. Se mal distribuída, pode significar justamente o oposto.

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