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Dartiu Xavier da Silveira: Crack é usado por miseráveis porque é barato [Entrevista]

“O poder público partiu do princípio de que a droga colocou aqueles usuários em situação de miséria, quando na verdade foi a miséria que os levou à droga”.

[Maria Inês Nassif, Carta Maior, 17 jan 12] O grande equívoco da ação policial do governo do Estado de São Paulo e da prefeitura da capital na chamada Cracolândia, o perímetro onde se aglomeram moradores de rua e dependentes de crack na cidade, definiu, de cara, o fracasso da operação: o poder público partiu do princípio de que a droga colocou aqueles usuários em situação de miséria, quando na verdade foi a miséria que os levou à droga. Esse erro de avaliação, segundo o psiquiatra e professor Dartiu Xavier da Silveira, por si só já desqualifica a ação policial.

Professor do Departamento de Psiquiatria e coordenador do Programa de Orientação e Assistência a Dependentes (PROAD), Faculdade de Medicina da Universidade Federal de São Paulo, Silveira há 25 anos orienta pesquisas com usuários de drogas e moradores de rua, normalmente patrocinadas pela Organização das Nações Unidas, e tem sido consultor do Ministério da Saúde na definição do Plano de Combate ao Crack. Nas horas vagas, ele desmistifica os argumentos usados pela prefeitura, município e uma parcela de psiquiatras sobre usuários de drogas. Continue lendo

Política higienista? Não, dever constitucional ~ por Cappelletti, Melo e Borges

[Folha SP, 14 jan 12] Quando o governo procrastina, o resultado é quase sempre desastroso. O descalabro da cracolândia é um desses casos.

Há 15 anos, algumas ruas do centro velho de São Paulo foram tomadas por uma nova droga, o crack. Durante o dia, os usuários desapareciam. Escondiam-se em canteiros de avenidas, em hotéis baratos e em organizações não governamentais (na maioria dos casos, religiosas).

À noite, quando as lojas se fechavam, como no clipe “Thriller”, de Michael Jackson, maltrapilhos e moribundos “surgiam”. Hordas de “batmans”, enrolados em cobertores, atacavam transeuntes e moradores para poder levar algo que permitisse comprar pedras de crack.

Autoridades? Sim, a Polícia Militar fazia rondas. Às vezes, fazia abordagens ou um estardalhaço com algumas dezenas de homens. Continue lendo

Vitórias na luta contra o crack

O pastor João Carlos Batista: paciente trabalho de corpo a corpo no coração da Cracolândia

As frentes de batalha na capital que estão colecionando avanços contra uma das drogas mais devastadoras do país

[Pedro Henrique Araújo, Veja, 18 dez 11] Cerca de 500 pessoas invadem a pista na Rua Helvétia, entre as alamedas Cleveland e Dino Bueno, nos Campos Elíseos. Todas viciadas em crack. Portando pequenos cachimbos, a maioria age em ritmo acelerado e tem as pupilas dilatadas. Entre os que fumam a droga ao ar livre, há uma mulher aparentando estágio avançado de gravidez. São 8 horas da noite e a Cracolândia funciona literalmente a pleno vapor. Muitos ficam dentro dos “mocós”, como são chamadas as casas abandonadas da região que eles invadem. Alguns buracos nas paredes abrem caminhos escuros, estreitos e malcheirosos — e neles se escondem mais usuários em meio a ratos, baratas e a todo o lixo acumulado.

João Carlos Batista, de 45 anos, mais conhecido como João Boca, líder da Missão Cena (Comunidade Evangélica Nova Aurora), anda por ali como se estivesse no quintal de casa. Ele visita o local diariamente há quinze anos. Aproxima-se dos “noias”, faz brincadeiras, dá conselhos e os convida a frequentar um abrigo da igreja localizado na Luz. Segundo seus cálculos, 15% das abordagens têm final feliz, o que teria resultado na recuperação de 130 dependentes até hoje. “Parece pouco, né?”, diz o pastor. “Mas é muito por se tratar desse tipo de tóxico. Quando um cara termina os nove meses do nosso tratamento, tenho quase certeza de que não voltará para cá.” Continue lendo