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Para analista, não dá para esperar saída perfeita para a Síria

syria_jihadists_al_nusraEm três anos da brutal guerra civil na Síria, a única coisa com que as potências estrangeiras concordam é que não há solução puramente militar para a tragédia que já matou cerca de 120 mil pessoas, gerou três milhões de refugiados e deixou o país quebrado, se é que tenha conserto, pelos próximos 25 ou 50 anos.

[Phillip J. Crowley, BBC Brasil, 11 dez 2013] Sem ninguém no horizonte para impor uma solução para a Síria, qual seria a melhor opção diplomática possível? Como implementá-la? Em quanto tempo?

Conflito geracional

O jogo de guerra da Síria tem mais de 20 atores, de potências estrangeiras como os Estados Unidos, a Europa, a Rússia, a ONU e alguns vizinhos chaves, até grupos nacionais sírios. Entre esses, o próprio regime de Bashar al-Assad, o Exército Livre da Síria, o grupo xiita libanês Hezbollah, além de vários grupos de extremistas islâmicos e da sociedade civil síria.

O equilíbrio de forças funciona assim: grupos pró-regime prevalecem sobre os que querem uma Síria totalmente distinta. E não há solução à vista.

A revolta na Síria representa um conflito geracional. A guerra pode durar mais uma década, com partes da Síria estabilizando, cedo ou tarde, dependendo dos cálculos políticos e militares de vários grupos.

Embora os grupos que atuam no conflito sírio acreditem que o país sobreviva com o território intacto, enclaves para grupos étnicos como os alauitas, os curdos e a oposição sunita devem ser necessários.

Assad

Havia pouca confiança que a segunda rodada de negociações em Genebra, em janeiro, iria levar a uma resolução. A Síria parece estar menos madura para uma solução do que há um ano. Assad acredita estar ganhando, principalmente após o acordo para destruição de armas químicas, que evitou uma intervenção americana.

A diplomacia deveria se empenhar em encontrar um denominador comum entre os atores estrangeiros que atuam na crise síria – os Estados Unidos, a Turquia, a Rússia, a Arábia Saudita e o Irã. Cada um tem visões diferentes sobre um cenário ideal para a Síria. Ninguém quer a vizinhança desestabilizada ou grupos extremistas ganhando força e ditando as regras em parte do território sírio.

As perspectivas de uma maior cooperação foram fortalecidas pelo acordo nuclear temporário com o Irã. As atuais negociações entre o Irã e os poderes globais criaram um ambiente propício para discutir a Síria. Mais progresso no front nuclear poderia abrir portas na Síria também. O oposto também é verdadeiro.

Um grande obstáculo, no entanto, é o futuro de Assad.

Criatividade diplomática

Os Estados Unidos, a Arábia Saudita e a Turquia insistem em tirar Assad do poder como parte de qualquer solução. Por outro lado, a Rússia acredita que Assad pode manter a Síria intacta e derrotar os extremistas. O Irã vê Assad como um ativo regional importante e protetor das minorias xiita e alauíta da Síria, que poderiam ser perseguidas sob um eventual governo sunita.

É possível harmonizar tantas diferenças? Sim, mas isso requer ajustes na política síria, criatividade diplomática, vontade política e um maior compromisso da administração Obama para com a questão síria.

Primeiro, os Estados Unidos precisam ver a Síria sob a perspectiva da segurança internacional e do contraterrorismo. A governança representativa e inclusiva da Síria é objetivo de longo prazo, para a próxima década. O foco inicial deve ser conter o conflito, entregar ajuda humanitária e prevenir extremistas islâmicos de ganhar mais território.

Segundo, cooperar com Assad não é um começo. É preciso convencer seus aliados (alauitas e cristãos) e o Irã de que presidente sírio deve sair de cena, com garantias para o período de transição. É nesse ponto que pode ser necessário estabelecer enclaves étnicos na Síria, como um solução temporária. Se extremistas islâmicos tentarem tomar um assentamento, os Estados Unidos poderiam considerar uma operação área, munidos de uma resolução do Conselho de Segurança a fim de reduzir às ameaças à sociedade síria.

Oriente Médio e EUA

Finalmente, um grupo de contato político pode ser estabelecido para dar seguimento às negociações de paz de Genebra. Os países que desempenharão algum papel no futuro da Síria poderiam participar, incluindo o Irã. Essa proposta seria para assegurar que todas as fronteiras da Síria estaria seguras. Também iria interromper o apoio estrangeiro a extremistas. Estabeleceria ainda corredores humanitários para assegurar ajuda. Daria ainda apoio para o retorno de refugiados, assim como ajudaria o estabelecimento de governos locais.

O Oriente Médio tem responsabilidade primária na resolução da crise síria, mas nada de mais substantivo vai ocorrer sem o compromisso americano.

Assim, rivais históricos podem ajudar encontrar a “melhor saída possível” para a Síria. O primeiro passo é reconhecer que a situação na Síria pode ficar ainda mais horrenda do que é hoje. Não é possível esperar uma solução perfeita.

*Phillip J. Crowley foi secretário de Estado assistente no governo Obama e é atualmente professor do George Washington University Institute of Public Diplomacy and Global Communication.

Pelo menos 500 morrem em massacre étnico na Nigéria

Islâmicos da etnia fulani invadiram casas de mataram todos que encontraram, incluindo mulheres e crianças

O confronto étnico-religioso ocorrido no domingo perto de Jos, no norte da Nigéria, deixou pelo menos 500 mortos, informou nesta segunda-feira, 8, o porta-voz do governo do estado de Plateau, Gregory Yenlong.

Armados com revólveres, metralhadoras e machados, pastores da etnia fulani invadiram as casas das cidades de Dogo Na Hauwa, Ratsat e Jeji no domingo e mataram todos que encontraram pela frente, incluindo mulheres e crianças.

“Nós conseguimos fazer 95 prisões, mas ao mesmo tempo mais de 500 pessoas foram mortas nesse abominável ato”, afirmou o nigeriano Dan Manjang, por telefone.

Acredita-se que o massacre, ocorrido a menos de 2 quilômetros da casa do governador de Plateau, Jonah Jang, tenha sido a resposta dos pastores aos confrontos religiosos de janeiro passado, que deixaram 326 mortos. Na ocasião, o incidente foi considerado pelos membros da etnia fulani uma ação organizada para assassinar muçulmanos.

O governo de Plateau anunciou um funeral coletivo para as vítimas. O presidente interino da Nigéria, Goodluck Jonathan, se reuniu com as agências de segurança do Estado e afirmou que os soldados estão em alerta vermelho. O massacre aconteceu mesmo com a imposição de um toque de recolher, que vigora na região das 18h às 6h desde janeiro passado.

Acredita-se que o motivo dos enfrentamentos na região seja a luta pela exploração de terras de cultivo entre cristãos e animistas, de um lado, e pastores muçulmanos fulanis, do outro.

Os conflitos envolvendo cristãos e muçulmanos na Nigéria já deixaram mais de 12 mil mortos desde 1999, quando foi implantada a sharia (lei islâmica) em 12 estados do norte do país (Estadão, EFE – 08 mar 2010).

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Relatos de testemunhas registrados na imprensa local dão conta de que grupos muçulmanos da etnia Hausa-Fulani invadiram por volta das 3h00 da manhã o vilarejo majoritariamente cristão de Dogo-Nahawa.

O repórter da BBC Richard Hamilton informou que os invasores chegaram atirando e, quando as pessoas começaram a fugir de suas casas, eram mortas a golpes de facão. O ataque teria durado quase três horas e deixado também cerca de 50 casas incendiadas.

Segundo Martin Plaut, editor para a África da BBC, a emissora recebeu fotos da área que mostram corpos de crianças e mulheres enfileirados.

Um porta-voz da Cruz Vermelha na região, Robin Waudo, disse à BBC que seus médicos estão atendendo pessoas feridas com facões e queimaduras, e com membros fraturados.

“Neste momento, os confrontos se acalmaram e os militares estão tentando controlar a situação”, afirmou.

O presidente em exercício da Nigéria, Goodluck Johnathan, colocou em alerta máximo as forças de segurança atuando na região central do país depois dessa nova onda de violência.

O ataque teria sido uma vingança pela morte de centenas de pessoas em janeiro, após confrontos entre cristãos e muçulmanos nos arredores de Jos. A região passou a ficar sob toque de recolher desde então.

A cidade de Jos tem sido palco de violência nos últimos anos justamente por estar posicionada na divisa entre o norte, de maioria muçulmana, e o sul do país, de maioria cristã.

‘Provocação aos cristãos’

A estimativa de 500 mortos foi feita pelo fórum cristão do estado de Plateau e confirmada por Gregory Yenlong, comissionário de informação do governo local, em entrevista a jornalistas nigerianos no vilarejo de Dogo-Nahawa.

O jornal nigeriano The Guardian relatou que o fórum cristão havia divulgado um comunicado em que condena o ataque classificado como “uma provocação aos cristãos”.

“Dogo Nahawa é uma comunidade cristã. As testemunhas dizem que os militantes muçulmanos Hausa-Fulani vieram cantando ‘Allahukabar’ (exclamação muçulmana que exalta Alah) e invadiram as casas, cortando seres humanos, incluindo crianças e mulheres com suas facas e facões”, diz o comunicado.

Os cristãos também protestam contra uma suposta omissão das forças armadas nigerianas. O comunicado relata que as forças de segurança teriam sido avisadas pelos cristãos do início do ataque, mas só teriam respondido ao chamado duas horas depois.

Peter Gyang, líder da comunidade local, disse ao The Guardian que os moradores da região não vão mais respeitar o toque de recolher.

“Nós seremos forçados a entrarmos em nossas casas às 6h00 da tarde, mas os invasores continuariam vindo e nos atacando sem qualquer intervenção do Exército ou da polícia. Então, não haverá mais toque de recolher para que nós possamos nos proteger”.

(BBC Brasil, 8 mar 2010)