A Igreja na internet: surgimento de uma religião 2.0?

Acender vela na capela, rezar o terço no Santuário, assistir a homilia na igreja… Foi-se o tempo. Agora, com um simples clique, o fiel-internauta pode fazer tudo isso – e muito mais – sem sair de casa. Ou, ao menos, as formas de sagrado tradicionais estão cada vez mais sendo disputadas com outras formas de ser religioso – na internet.

[Thamiris Magalhães de Sousa*, IHU On-Line, 12 set 11] Cria-se, então, a possibilidade da manifestação da fé tendo um mediador, no caso, o computador, que passa a assumir um importante papel: o de mudança de hábitos do cotidiano, que faz com que o internauta católico acabe utilizando formas diferentes de execução de algumas práticas religiosas populares neste processo.

Em sítios onde se encontram velas virtuais há também outros serviços para os internautas, inclusive venda de produtos religiosos. Através de sítios católicos, existe um duplo fluxo comunicacional, em que a Igreja se comunica com o fiel, que, consequentemente, comunica-se com ela.

Na versão digital das velas virtuais, funciona assim: primeiramente o fiel deve preencher os dados pessoais para poder incluir o pedido de oração. Esse pedido poderá ser direcionado a Deus ou até mesmo sem destinatário explícito. Existe a possibilidade de o internauta escolher o formato desejado de vela, para depois clicar no botão “acender” ou “enviar”, para que a oração seja validada.

Percebe-se que há uma inevitável quebra do tradicionalismo a partir do momento que o internauta deixa de frequentar o templo e passa a utilizar esses serviços religiosos disponíveis na rede. Existe a possibilidade da criação de novos tipos de negócios religiosos, na tentativa de atrair novos consumidores, fiéis, por meio das novas tecnologias digitais. O tradicionalismo religioso vem sofrendo modificações. Acender uma vela na igreja era uma demonstração de gratidão por uma graça alcançada. O cenário mudou. Agora basta um clique para que ela seja acesa, o que não necessariamente muda o sentimento do fiel que a acendia na capela.

Já se fala até em vários cíberes (do inglês cyber) da Igreja. Ciberteologia (que é também o nome de uma revista). Ciberigreja. Cibercatequese. E ciberpastoral. Um exemplo? Dom Celli , presidente do Pontifício Conselho para as Comunicações Sociais, assinalou na blogosfera a matriz de novas culturas. O padre jesuíta Antonio Spadaro  revelou que já abriu um blog próprio de “ciberteologia”. O Pe. Roderick Von-Hoegen, também jesuíta, relembrando que os apóstolos eram pescadores, disse que “para pescar, é preciso a isca certa e, para os jovens de hoje, a isca certa é a Rede”  .

Hoje, na sociedade em vias de midiatização, a ligação para com o divino pode ser realizada de inúmeras formas, inclusive diante do altar. Para que o indivíduo esteja cada vez mais “conectado” ao sagrado, a igreja busca atingir cada vez mais fiéis, utilizando-se de diversos meios – como os digitais – para alcançar o seu fim principal. Por exemplo, se o fiel desejar realizar uma oração a qualquer momento, em casa, no trabalho ou até mesmo no transporte, poderá fazê-lo sem problema. Basta fazer o download do serviço de oração desejado em formato mp3. Isso só para ficarmos neste exemplo, uma vez que são inúmeros os serviços disponíveis na atualidade pela Igreja para que o fiel realize suas orações, acenda vela a seu santo, reze a Bíblia, o terço, assista à missa etc. Todos os exemplos, hoje, podem ser acessados na internet.

Vivemos uma mudança de comportamento. Estamos no meio de um processo, da mudança de uma “antiga ambiência” caracterizada por um mundo analógico, de produtor, receptor e canal; para um “mundo novo”, uma “nova ambiência”, caracterizada pelo processo de midiatização da sociedade, ainda pouco conhecida e explorada, mas que tem como uma de suas principais características o compartilhamento de informações, a participação .

Quer dizer, vivemos hoje um processo de midiatização da sociedade , em que, por meio das tecnologias digitais e da internet, uma nova manifestação fiel-igreja se torna expressiva e cada vez mais visível. Hoje, em pleno século XXI, ir ao templo para rezar se tornou algo secundário; acender uma vela na capela, rezar o terço na igreja, ou até mesmo se encontrar com as pessoas no templo, nos dias e horários pré-estabelecidos pela autoridade eclesial, estão se tornando cada vez mais disputados com outras formas de “ser religioso” – na internet.

Mas a questão que surge diante desse novo cenário é: será que está surgindo um novo modo de ser religioso? Uma coisa, porém, é fato: não há dúvida de que os fiéis estão se tornando cada vez mais participativos, deixando de ser meros receptores e atuando junto à Igreja, presencialmente ou pela internet, seja apenas rezando seu terço, acendendo a vela ou pedindo orientações espirituais aos padres na rede.

Os membros da comunidade eclesial (padres, irmãs, bispos, diáconos, presbíteros, arcebispos etc.) devem perceber a mudança epocal que ocorre na sociedade cada vez mais midiatizada, ao perceber que, muitas vezes, mais importante do que o que é dito e lido na internet, o simples fato de estar conectado nesse novo mundo, nessa nova ambiência, muda tudo, uma vez que a internet e as tecnologias com certeza não são apenas meros meios de divulgação de mensagens. Elas, portanto, não são instrumentos neutros! Mas, sim, configuram um novo ser. Um ser conectado, mais interativo, participativo, e por que não, crítico?  A igreja, portanto, não deve deixar de reconhecer esta mudança, uma vez que, como dizia McLuhan: “o meio é a mensagem”.

A pergunta que fica é: que novo modo de ser religioso começa a emergir da sociedade em estado de midiatização, com rituais antes realizados apenas diante do altar, sendo propagados abundantemente pela rede, na web? Será que está iniciando uma nova era para a religião? Uma religião 2.0? Que consequências essas transformações trarão para a instituição Igreja? Para essas indagações, só o tempo poderá oferecer as possíveis respostas. E os trabalhos, suas relevantes contribuições.

* Thamiris Magalhães de Sousa é Jornalista formada pela Universidade da Amazônia (Unama), em Belém/PA. Atualmente, cursa o Mestrado em Ciências da Comunicação na Unisinos, na linha de pesquisa: Midiatização e Processos Sociais. É Jornalista da Revista IHU On-Line do Instituto Humanitas Unisinos – IHU.

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